quinta-feira, março 22, 2007

Reflexões

A vida é a coisa mais bela que há. As nossas capacidades são emocionantes. Só o facto de vermos o mundo é belo. A própria tristeza é bela. A alegria também é bela. São das coisas mais belas que há, tristeza e alegria. Tristeza pelo que já passou, alegria na tristeza. Consciência das coisas como elas são. Consciência das inevitabilidades. A morte, quando surge, não é bela. A tristeza na morte ou na dor não é uma coisa bela, é dura de viver. Mas as memórias que ficam são belas e o desaparecimento, mais tarde, pensado como inevitabilidade, é belo. A lei do Cosmos é bela. A mortalidade dá um acrescento de beleza às nossas vidas. Dá-nos forças para superar o medo da morte, para sermos maiores do que a morte. A morte dá uma força incrível às nossas vidas. Torna-nos corajosos. Não para que andemos a fazer coisas que poderiam levar à morte, mas para aceitarmos essa lei cósmica, a lei do desaparecimento, da passagem do tempo. Aceitar a passagem do tempo, aceitarmo-nos a nós mesmos. Somos todos passageiros neste mundo. A vida é uma coisa bela, pelas emoções: emoções com o presente, emoções com a memória, emoções com a imaginação. As emoções são a coisa mais bela que há, e o melhor que a vida poderia ter tido. Mas elas são boas enquanto há consciência delas. Por isso, a consciência é das melhores coisas que a vida poderia ter tido, uma enorme dádiva. Por outro lado, a consciência, por vezes, pode ser uma tortura, quando estamos mal. Mas penso que os momentos bons superam os maus. Penso que toda a vida vale a pena ser vivida, pelos momentos bons. Até a vida na pobreza. Todas as vidas têm momentos bons. Mas talvez haja quem prefira morrer - quem se suicida. Talvez quem viva na pobreza extrema prefira morrer a viver uma vida de sofrimento. Mas enquanto há vida, há esperança, creio. Todas as situações, excepto as de doença incurável, são reversíveis. Há sempre esperança de uma vida melhor. Eu creio nessa esperança. Por isso, creio que todas as vidas valem a pena ser vividas. Pelos momentos bons. Não há nada como um bom momento. Um bom momento é algo que está próximo do sagrado. É mesmo o mais sagrado que podemos ter, bem vistas as coisas; pois que há melhor do que um bom momento?, um momento em que nos sentimos bem, em que estamos bem, em que as coisas correm bem. Um bom momento é, para mim, um momento de paz. Um momento de paz é um momento belo. Belo porque pacífico. Por exemplo um momento de contemplação ou de reflexão. Um momento de reflexão pode ser um momento de contemplação do nosso estado mental. No fundo, em cada momento, tudo o que percepcionamos, tudo o que sentimos, tudo o que está imanente à nossa consciência, tudo o que existe para nós nesse momento, é o que constitui o nosso estado mental nesse momento. Não são as coisas elas mesmas, mas a consciência das mesmas, que constitui o nosso estado mental em dado momento. E elas, para nós, é impossível que sejam mais do que consciências, percepções, sensações, memórias, imaginações, desejos. Isto para dizer que o mundo, tal como pode ser para nós, é constitutivo do nosso estado mental em dado momento. O mundo pensado como meio ambiente. Não quero com isto dizer que seja construído pela mente - ele é independente da mente, mas nós só o conhecemos enquanto objecto mental. Tudo o que conhecemos, conhecemos enquanto objecto mental, mas eles mesmos são independentes da mente. São alcançados pela consciência. A nossa consciência abarca o mundo. E isso é belo. O facto de termos consciência do mundo é belo, quando o mundo é belo. Mas há pessoas que vivem em terror. As crianças na guerra, os soldados, os pobres... Desejaria que o mundo pudesse ser belo também para essas pessoas, no fundo que houvesse paz. A paz é um bem inestimável. A paz traz liberdade, autonomia. Não há paz sem autonomia, sem emancipação. Alguém que não pode decidir por si é alguém que não está em paz. A paz vem com a possibilidade de escolha sem constrangimentos. A paz equipara-se à liberdade. Ser livre é o melhor que há. Todas as coisas boas, belas, vêm com a paz e com a liberdade. Sem a liberdade há o terror. Há quem viva em terror. O terror é algo que quero esquecer, não porque não me preocupe com quem vive em terror, mas porque acho que todas as pessoas deveriam viver em paz e por isso que quem pode viver em paz que viva em paz. A vida contemplativa é realmente a melhor que há. Por isso defendo um estilo de vida mais recatado, mais pacífico, menos produtivo e menos consumista. No fundo, um estilo de vida que não se adapta ao modelo da cidade. Na cidade, só há trabalho e desemprego. Não há tempo para nada, e contempla-se, na maioria, coisas artificiais. Uma paisagem urbana também pode ser bela, mas prefiro um contacto mais íntimo com a natureza, a vida num meio menos urbano. Se tiver tempo para contemplar a natureza, para viver num meio mais pequeno e mais pacífico, tenho o que quero. Há pessoas, por sua vez, que preferem viver na cidade, talvez por acharem a vida num meio mais pequeno muito monótona. Eu dou-me bem com a monotonia, com essa solidão, porque estou sempre acompanhado pelos meus pensamentos. Não porque viva muito centrado em mim, apesar de ser um pouco narcisista, mas porque vivo nessa espécie de harmonia com o mundo, especialmente quando se trata do mundo natural. Não vivo os meus pensamentos, a minha imaginação, a minha consciência, como algo que exista fechado em mim e que me leve ao fechamento de mim em mim, mas como uma abertura ao mundo e ao Cosmos. Creio que a nossa mente é aberta ao Cosmos, uma espécie de portal para o mesmo, e não algo que nos feche em nós. Temos a imaginação, a memória - capacidades espectaculares. Conjuntas com as emoções são ainda mais espectaculares. O melhor que há são boas emoções. Consciência de boas emoções traz uma satisfação incrível. Talvez seja um pouco hedonista, mas acho que o hedonismo é bom. O prazer é mesmo das melhores coisas que podemos ter. Talvez mesmo a melhor. Mas o prazer é um misto de emoções e consciência. Consciência de boas emoções. As boas emoções podem vir do exterior, através do meio, satisfação com o meio, ou do interior, através das memórias ou imaginações... Não há nada tão bom na vida como o prazer.

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