quinta-feira, outubro 11, 2007

Eliminação das propriedades abstractas e redução da realidade ao físico e ao mental

Há um problema, de muitas consequências, subjacente ao post anterior, quando digo que o que é eterno cria constantemente e não muda. É que, porquanto cria constantemente, podemos dizer que não muda de estado mas, também, que esse estado é o da eterna mudança, porque criar é mudar. Mas as propriedades eternas não mudam. Se não mudam, não criam. E isso é o problema: é que definimos a existência como ter poder causal (algo existe se, e só se, tem poder causal) e poder causal foi entendido como provocar mudança. Por isso, ou revemos a nossa noção de existência, ou dizemos que as propriedades eternas não existem. E a que reduziríamos as propriedades eternas, abstractas (ex. lógicas, matemáticas)? Teríamos de reduzi-las a propriedades mentais. Um exemplo: o modus ponens existe se, e só se, é pensado, quando é pensado. É uma tese menos misticamente atraente, mas parece-me mais verdadeira, porque não consigo conceber que algo exista sem que tenha poder causal.

Poderíamos, talvez, aceitar uma única propriedade abstracta, que seria a eternidade e que poderia ser definida como a constante mudança e, também, como a propriedade que tem a propriedade de aceitar propriedades, não mudando, no entanto, por aceitá-las. O problema é que é artificial dizer-se que algo que aceita algo não muda, porque há diferença entre algo ter ou não ter algo. Assim, a eternidade não seria o equivalente à substância dos substancialistas mas, apenas, a totalidade do tempo e seria, por sua vez, a única propriedade abstracta. O problema é que, se é abstracta, não muda e, se não muda, não cria e, se não cria, não tem poder causal e, se não tem poder causal, não existe. De maneira que ou diríamos que o tempo não existe, ou que não é abstracto, o que implicaria reduzi-lo ao físico ou ao mental ou a ambos.

É que tenho consciência de que o tempo existe; lembro-me do passado. O tempo é físico ou mental - eliminámos o último objecto abstracto.

Se aceitarmos esta redução, teremos de explicar como são possíveis as objectividades da matemática e da lógica e, penso, o modo mais imediato de o fazermos é dizermos que todos os humanos têm uma estrutura corporal (cerebral) semelhante (diferente de "igual"), capacidades semelhantes e que, dada a interacção do cérebro com o mundo, que é semelhante para todos os corpos humanos, surgem construções mentais semelhantes. Teríamos de dizer que os cérebros estão equipados de forma semelhante e que, por isso, compreenderiam o mundo de forma semelhante.

É que a teoria que postula objectos abstractos envolve-se em inúmeros problemas e, nomeadamente, aceita acriticamente certas frases (ex. como quando eu aceitei acriticamente que o que é eterno não muda porque cria constantemente, no post anterior. Ora, se cria constantemente, muda constantemente). Segundo a nova tese, então, temos um mundo povoado exclusivamente por propriedades físicas e propriedades mentais e, por isso, temos de explicar a sua origem por umas, outras, ou ambas. É de notar, no entanto, que a nova tese só tem de ser aceite se não quisermos descartar a noção de existência (existir é ter poder causal; algo existe se, e só se, tem poder causal).

Sem comentários: